MP n. 936/20
ATUALIZAÇÃO: QUESTÕES TRABALHISTAS E ASSISTENCIAIS RELACIONADAS AO NOVO CORONAVÍRUS
Com o agravamento da pandemia do novo coronavírus no Brasil, medidas restritivas capazes de frear o contágio foram adotadas em praticamente todo território nacional. O reflexo no faturamento de diversos setores da economia foi imediato, de modo que os esforços para a contenção do avanço do novo vírus apresentam um lado nefasto: a parada geral da economia.
Em consequência da paralisação das atividades econômicas, o próprio governo federal, em 20/03/2020, reduziu a projeção de crescimento do PIB de 2,1% para 0,02%. Analistas da JPMorgan, por outro lado, afirmam que o país passará por uma recessão com declínio de 1% no PIB em 2020, em atualização da expectativa original de crescimento de 1,6%.
Apesar dos esforços conjuntos no sentido de conter o avanço do novo vírus, a drástica redução da previsão de crescimento do país denota a rápida deterioração das expectativas em meio ao avanço do novo coronavírus e seu avassalador impacto na economia.
Nesse contexto, diversos setores da economia e da sociedade civil passaram a exigir a adoção de programas específicos de manutenção do emprego e da renda, conjuntamente com a disposição de medidas de trabalhistas complementares.
Em atenção à gravidade da crise econômica que se avizinha, o presidente da República editou, em 01/04/2020, a Medida Provisória n. 936, que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para o enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo n. 6/2020.
Dentre as medidas elencadas estão a redução proporcional de jornada e salário e a suspensão dos contratos de trabalho, com a contrapartida estatal de complementação da renda do trabalhador. A MP é aplicável apenas aos trabalhadores formalizados.
Abaixo serão abordados, portanto, o programa emergencial e as medidas trabalhistas complementares que passaram a vigorar com a edição da MP.
Aspectos gerais
Conforme mencionado, dentre os objetivos da MP estão a preservação do emprego e da renda, a garantia de continuidade das atividades laborais e empresariais e a redução do impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de emergência de saúde.
A intenção da MP é privilegiar os trabalhadores “com carteira assinada”, não sendo aplicada no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos órgãos da administração pública direta e indireta, às empresas públicas e sociedades de economia mista.
Os acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho deverão ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato laboral, no prazo de dez dias corridos, contado da data de sua celebração.
As medidas são aplicáveis por meio de acordo individual aos trabalhadores:
i) com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00; ou
ii) aos portadores de diploma de nível superior que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, correspondente a R$ 12.202,12.
Para os demais trabalhadores, as medidas previstas na MP poderão ser estabelecidas por convenção ou acordo coletivo, à exceção da redução de jornada de trabalho e de salário de 25%, que pode ser pactuada por acordo individual indistintamente.
O tempo máximo de redução proporcional de jornada e de salário é de 90 dias, ao passo que a suspensão do contrato de trabalho poderá perdurar até 60 dias.
PROGRAMA EMERGENCIAL DE MANUTENÇÃO DO EMPREGO E DA RENDA
Benefício Emergencial de Preservação do Emprego
O benefício será pago em caso de redução proporcional de jornada de trabalho e de salário e em caso de suspensão temporária do contrato de trabalho;
O benefício, que será custeado pela União, será devido mensalmente a partir da data do início da redução da jornada ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, com pagamento previsto no prazo de 30 dias contado da comunicação ao Ministério da Economia;
Cumpre ao empregador informar ao Ministério da Economia a respeito da redução de jornada e de salário ou a suspensão do contrato, no prazo de 10 dias, contado da data da celebração do acordo. Na hipótese de descumprimento do prazo, o empregador ficará responsável pelo pagamento da remuneração no valor anterior à redução da jornada e salário ou da suspensão do contrato de trabalho;
O pagamento ocorrerá exclusivamente enquanto durar a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho;
O valor do benefício terá como base de cálculo o valor mensal do seguro-desemprego a que o empregado teria direito, com as especificações nos tópicos correspondentes.
Redução proporcional de jornada de trabalho e de salários
Durante o estado de calamidade pública, o empregador poderá acordar a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário de seus empregados, pelo prazo de até noventa dias, observados os seguintes requisitos:
i) Preservação do valor do salário-hora de trabalho;
ii) Pactuação por acordo individual escrito entre empregador e empregado, que será encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos;
iii) Redução de jornada de trabalho e de salário, exclusivamente, nos seguintes percentuais:
1) 25%;
2) 50%; ou
3) 70%;
O cálculo do benefício a ser auferido será feito por meio da aplicação do percentual da redução sobre a base de cálculo (seguro-desemprego a que teria direito o empregado);
Os efeitos da norma cessam e a jornada de trabalho e o salário pago anteriormente serão restabelecidos no prazo de dois dias corridos contado:
a) da cessação do estado de calamidade pública;
b) da data estabelecida no acordo individual como termo de encerramento do período de redução pactuado; ou
c) da data de comunicação do empregador que informe ao empregado sobre sua decisão de antecipar o fim do período de redução pactuado.
Suspensão temporária do contrato de trabalho
1) O prazo máximo de suspensão é de sessenta dias, e poderá ser fracionado em até dois períodos de trinta dias;
2) A suspensão deve ser pactuada por acordo individual escrito entre empregador e empregado, respeitado o prazo mínimo de dois dias corridos para que o documento seja enviado ao empregado;
3) No período de suspensão temporária do contrato, o empregado fará jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador aos seus empregados e ficará autorizado a recolher para o Regime Geral da Previdência Social na qualidade de segurado facultativo;
Para fixação do valor do benefício a ser percebido pelo empregado, deve ser obedecido o seguinte critério:
1)Como regra geral, equivalente a 100% do valor do seguro-desemprego a que teria direito, caso seja acordada a suspensão pelo prazo máximo de sessenta dias;
2)Equivalente a 70% do seguro-desemprego a que teria direito, na hipótese em que a empresa tenha auferido, no ano-calendário de 2019, receita bruta superior a R$ 4.800.000,00. Nesse caso, a empresa é responsável pelo pagamento de ajuda compensatória que totaliza 30% do valor do salário do empregado;
O contrato de trabalho será restabelecido no prazo de dois dias corridos contado:
1) da cessação do estado de calamidade pública;
2) da data estabelecida no acordo individual como termo de encerramento do período de suspensão pactuado; ou
3) da data de comunicação do empregador que informe ao empregado sobre sua decisão de antecipar o fim do período de suspensão pactuado.
Garantia provisória no emprego
Fica reconhecida a garantia provisória no emprego ao trabalhador que receber o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda em decorrência da redução da jornada e de salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, nos seguintes termos:
a) Durante o período acordado de redução da jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho; e
b) Após o restabelecimento da jornada de trabalho e de salário ou do encerramento da suspensão temporária do contrato de trabalho, por período equivalente ao acordado para a redução ou a suspensão.
Caso ocorra dispensa sem justa causa no período de garantia provisória do emprego, o empregador, além das parcelas rescisórias, deverá indenizar o trabalhador no valor de:
a) 50% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 25% e inferior a 50%;
b) 75% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, na hipótese de redução de jornada de trabalho e de salário igual ou superior a 50% e inferior a 70%; ou
c) 100% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia provisória no emprego, nas hipóteses de redução de jornada de trabalho e de salário em percentual superior a 70% ou de suspensão temporária do contrato de trabalho.
Negociações coletivas
As medidas são aplicáveis por meio de acordo individual para alguns trabalhadores, a depender de sua faixa de renda, conforme exposto nas regras gerais. Aos demais trabalhadores, as medidas estão autorizadas desde que haja negociação coletiva;
A convenção ou o acordo coletivo de trabalho poderão estabelecer percentuais de redução de jornada de trabalho e de salário diversos dos previstos na MP n. 936 (25%, 50% e 70%);
Na hipótese de percentuais distintos, o pagamento do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda será devido nos seguintes termos:
1) Sem benefício para a redução de jornada e de salário inferior a 25%;
2) De 25% sobre a base de cálculo (valor do seguro-desemprego a que teria direito o empregado) para a redução de jornada e de salário igual ou superior a 25% e inferior a 50%;
3) De 50% sobre a base de cálculo para a redução de jornada e de salário igual ou superior a 50% e inferior a 70%; e
4) De 70% sobre a base de cálculo para a redução de jornada e de salário superior a 70%.
Em resumo, as medidas excepcionais adotadas por meio da MP n. 936/2020 autorizam medidas anormais de redução de jornada e de salário e de suspensão do contrato de trabalho fundadas na tentativa de garantir a manutenção dos empregos. Como aspecto positivo, verifica-se a contrapartida do Estado por meio do Benefício Emergencial, capaz de garantir a renda do trabalhador.
É de se destacar que, até o momento da publicação deste artigo, o Ministério da Economia não publicou o ato no qual definirá os meios de comunicação entre empregadores e Ministério, a fim de que as medidas sejam informadas e aos trabalhadores seja possibilitado o acesso ao benefício emergencial.
A MP n. 936/2020 já está em vigor, e deverá ser apreciada pelo Congresso Nacional no prazo de 120 (cento e vinte) dias. Caso a MP seja rejeitada pela Câmara ou pelo Senado, bem como se perder a eficácia pelo decurso do prazo, os parlamentares deverão editar um decreto legislativo para disciplinar os efeitos jurídicos gerados durante sua vigência.